Abertura dos Olhos Kaimoku Sho
(Brasil Seikyo, edição nº 1749, 29/05/2004, página C6.)
Eu e meus discípulos, mesmo que ocorram vários obstáculos e maldades, desde que não se crie a dúvida no coração, atingiremos naturalmente o estado de Buda(1). Não duvidem dos benefícios do Sutra de Lótus(2), mesmo que não haja a proteção dos céus(3). Não lamentem a ausência de segurança e tranqüilidade na vida presente(4). Embora tenha ensinado dia e noite a meus discípulos, todos, criando a dúvida, abandonaram a fé. O que é costumeiro no tolo é esquecer nas horas cruciais o que prometera nas horas normais.
RESUMO E CENÁRIO HISTÓRICO
A “Abertura dos Olhos” é uma das cinco mais importantes escrituras de Nitiren Daishonin, a qual revela a sua identidade como o Buda dos Últimos Dias da Lei, possuidor das Três Virtudes de soberano, mestre e pais. É datada de fevereiro de 1272, quando Daishonin encontrava-se sob uma severa condição, exilado na Ilha de Sado(5), e endereçada a Shijo Kingo(6), um dos seus discípulos de maior destaque na região de Kamakura que, como samurai, servia ao clã Hojo. Por ocasião da Perseguição de Tatsunokuti(7), ocorrida em 12 de setembro do ano anterior, Shijo Kingo havia acompanhado o seu mestre até o local da execução com a decisão de morrer ao seu lado e testemunhou o grande triunfo de Daishonin. Mesmo após o exílio à longínqua Ilha de Sado, Shijo Kingo o visitou pessoalmente, além de enviar-lhe diversos materiais e oferecimentos por intermédio de seus mensageiros.
Nesta época, muitos dos discípulos de Daishonin também foram perseguidos com a desapropriação de suas terras e banidos de seus feudos pelas autoridades, demitidos do serviço pelos lordes, expulsos de suas famílias ou então penalizados com o pagamento de altas taxas. Diante dessas adversidades, muitos acabaram duvidando da prática do budismo. Por outro lado, Daishonin também foi alvo de difamações por parte das pessoas em geral e até mesmo de seus seguidores com críticas como: “Se ele é o devoto do Sutra de Lótus, por que razão não é protegido pelos deuses budistas?”
Essa escritura é uma resposta a essas críticas e dúvidas, e revela que o fato de Daishonin sofrer grandes perseguições nada mais é do que o cumprimento das profecias do Sutra de Lótus. Por essa razão, intitulou essa escritura “Abertura dos Olhos”, que significa abrir os olhos cegos das pessoas por causa do seu egoísmo e de sua ignorância. No budismo, geralmente os termos “Abertura da Luz”, “Abertura da Inteligência” e “Abertura da Luz da Inteligência” são freqüentemente substituídos por “Abertura dos Olhos”.
Assim, Nitiren Daishonin escreveu esta carta para revelar que ele era o verdadeiro devoto do Sutra de Lótus que mantinha a mais correta prática do budismo, além de declarar que era o Buda dos Últimos Dias da Lei(8), revelando o Objeto de Devoção em termos de pessoa(9).
TERMOS E FRASES
(1) Estado de Buda: Constitui-se numa condição de vida em que a pessoa adquire a sabedoria que lhe permite compreender a verdadeira essência da vida, de manifestar uma profunda benevolência por todas as pessoas e ter percepção das Três Existências da Vida e da Lei do Universo. É uma condição de vida de felicidade absoluta ou iluminação que nada pode corromper.
(2) Sutra de Lótus: Refere-se, em geral, aos vinte e oito capítulos expostos pelo Buda Sakyamuni como seu ensino mais elevado. No contexto desta escritura, é o Sutra de Lótus interpretado do ponto de vista de Nitiren Daishonin, isto é, refere-se à Lei de Nam-myoho-rengue-kyo.
(3) Proteção dos Céus: Refere-se aos Deuses Budistas que tem a função de proteger as pessoas que praticam o Verdadeiro Budismo. Pelo princípio budista de Inseparabilidade da Pessoa e seu Ambiente (esho funi), nossa força vital, determinação e ações influenciam as circunstâncias de forma favorável a nos proteger dos infortúnios. Portanto, no budismo, os Deuses Budistas são uma força inerente em nossa vida.
(4) Segurança e tranqüilidade na vida presente: O Sutra de Lótus expõe que as pessoas que praticam a Lei Mística são beneficiadas com segurança e tranqüilidade na presente existência.
(5) Exílio na Ilha de Sado: Após a tentativa de execução mal-sucedida na perseguição de Tatsunokuti, o governo decidiu exilar Daishonin na Ilha de Sado, onde permaneceu de 1o de novembro de 1271 a fevereiro de 1274.
(6) Shijo Kingo: Tornou-se discípulo de Daishonin por volta de 1256 em Kamakura e foi um samurai da aristocracia que possuía habilidades médicas. Levou avante uma forte e sincera fé por toda sua vida e é conhecido como um exemplo de praticante budista. Recebeu várias escrituras de Daishonin.
(7) Perseguição de Tatsunokuti: Perseguição sofrida por Nitiren Daishonin em 12 de setembro de 1271 em que soldados liderados por Hei no Saemon, chefe da força militar, tentaram decapitá-lo no campo de execução de Tatsunokuti, em Kamakura.
(8) Últimos Dias da Lei (Mappo): A propagação de qualquer religião pode ser dividida em três períodos ou eras de acordo com o seu grau de influência na sociedade. O primeiro período é a fase em que uma religião pode oferecer uma solução viável para os problemas das pessoas. No segundo, a religião estabelece-se na cultura porém torna-se formal e deixa de corresponder às necessidades do povo. Na terceira fase, a religião cai no desinteresse total do povo e perde completamente a sua eficácia. No budismo, essas três eras são denominadas, respectivamente, de Primeiros Dias da Lei, Médios Dias da Lei e Últimos Dias da Lei. Em termos de extensão de tempo, são respectivamente o primeiro milênio, o segundo milênio e o terceiro milênio e eras posteriores ao falecimento do Buda Sakyamuni. Neste último, o Budismo de Sakyamuni perde completamente a capacidade de salvar as pessoas e Daishonin revela o supremo budismo para a salvação de toda a humanidade.
(9) Objeto de Devoção em termos de Pessoa: Pelo princípio de unicidade de Pessoa e Lei (ninpo ikka), tanto o Buda (pessoa) como o ensino (Lei) são em sua essência uma única entidade. Nitiren Daishonin revelou o objeto de devoção em termos de Pessoa e em termos de Lei (Nam-myoho-rengue-kyo), incorporando-o na forma de Gohonzon.
(10) Amenização do Efeito Cármico (tenju kyoju): Este princípio elucida que por meio da prática budista podemos receber os efeitos do mau carma do passado de uma forma amenizada.
(11) Prática Individual e Prática Altruísta: A “prática individual” é o empenho na prática da fé (recitação do Gongyo e Daimoku) para beneficiar a si mesmo. A “prática altruísta” refere-se ao ato de ensinar o budismo para beneficiar outras pessoas.
MATÉRIA PARA A REUNIÃO DE PALESTRA
Eu e meus discípulos, mesmo que ocorram vários obstáculos e maldades, desde que não se crie a dúvida no coração, atingiremos naturalmente o estado de Buda(1).
Esta é uma frase de incentivo e de orientação para todos os discípulos bastante conhecida da escritura “Abertura dos Olhos”, na qual Daishonin ensina as razões da ocorrência de severas perseguições e que o estado de Buda é alcançado quando se mantém a fé sem criar dúvidas.
Na época, paralelamente à Perseguição de Tatsunokuti e ao exílio na Ilha de Sado sofridos por Daishonin, seus discípulos também foram atingidos por inúmeras perseguições. Muitos deles, só pelo fato de serem seguidores de Daishonin, foram expulsos de seu feudo, de suas casas e de suas propriedades, as quais foram tomadas pelas autoridades. Diante disso, muitos criaram a dúvida e outros abandonaram a prática da fé temendo perseguições.
Nessas circunstâncias, Daishonin dedicou esta frase aos seus seguidores, iniciando por “Eu e meus discípulos”, mostrando que tanto ele como seus discípulos podem atingir infalivelmente o estado de Buda desde que mantenham a inabalável prática da fé mesmo diante das terríveis adversidades.
Sem dúvida, um dos pontos fundamentais no Budismo de Nitiren Daishonin é o da unicidade de mestre e discípulo. Por meio da realização concreta do seu próprio estado de Buda, Daishonin demonstra aos seus discípulos o verdadeiro caminho para a iluminação. Nesta frase da escritura, Daishonin deixa claro que o ponto comum nesta unicidade de mestre e discípulo é justamente a atitude da fé sem criar dúvidas no coração. E, quando mantemos esta verdadeira fé, nos assegura a certeza do estado de Buda.
As dificuldades e os obstáculos enfrentados para sustentar a fé no Budismo de Daishonin correspondem à “Amenização do Efeito Cármico”(10), isto é, os efeitos do mau carma recebidos de forma amenizada. Portanto, passando por essas circunstâncias pode-se transformar a vida e estabelecer a felicidade absoluta nesta existência. Assim, quando ocorrem severas dificuldades, estas devem ser acatadas como uma boa oportunidade para se atingir a iluminação e fortalecer a decisão na prática da fé.
Em uma orientação, o presidente Ikeda afirma: “Daishonin escreveu estas palavras: ‘Quanto maiores as dificuldades que lhe ocorrerem, maior a satisfação que ele (devoto do Sutra de Lótus) sentirá por causa de sua forte fé’. Não importando o quanto sejam golpeadoras as ondas que encontrarmos, é importante que desafiemos de frente com coragem. É crucial não fugirmos de nossos problemas nem nos entregarmos à covardia. Enfim, o único caminho que leva à vitória é nos tornarmos fortes. Quanto maiores forem as dificuldades que enfrentarmos, maior será a glória a nos aguardar, e também mais grandiosos serão a boa sorte e o benefício que acumularemos na vida. Vamos avançar com o espírito de que ‘não há nenhuma ocasião em que a justiça falte’.”
(Brasil Seikyo, edição no 1.707, 12 de julho de 2003, pág. A3.
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